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quarta-feira, 19 de abril de 2023

MPF afirma que avanço de empreendimento em Boipeba é legalizar grilagem

 
O procurador do Ministério Público Federal Ramiro Rockenbach afirmou na terça-feira (18) que a ocupação de uma área na Ilha de Boipeba, em Cairu (175 km de Salvador), para construção de um megaprojeto turístico e imobiliário pode constituir fraude e grilagem.
Em audiência pública na Comissão de Direitos Humanos e Segurança Pública da Assembleia Legislativa da Bahia, em Salvador, o procurador afirmou que o terreno do empreendimento pertence à União e que sua ocupação deve seguir o que prevê a legislação.
“Existem regras e estas regras precisam ser cumpridas. Seguir o caminho que está se pretendendo seguir significaria, sem medir palavras, oficiar uma grilagem de terra pública e isso não é admissível”, afirmou Rockenbach à reportagem.
A empresa Mangaba Cultivo de Coco, responsável pelo projeto, nega irregularidades e afirma que a documentação assegura a posse do imóvel.
O empreendimento teve licença ambiental concedida pelo Inema, órgão ambiental do governo da Bahia, no início de março.
O projeto prevê a construção de um condomínio com 67 lotes, duas pousadas (uma com 25 quartos e outra com 25 casas), infraestrutura viária, píer e pista de pouso. A área total do terreno é de 1.651 hectares, equivalente a 20% da Ilha de Boipeba, e fica nas proximidades da comunidade Cova da Onça, onde vivem cerca de 700 pessoas.
Também foi autorizado o uso de dois lotes para a construção de um centro cultural, um campo de futebol e estação de tratamento de resíduos, que seriam destinados à comunidade local.
A legislação federal prevê que terrenos da União podem ser utilizados mediante um regime de ocupação. Na avaliação do procurador Ramiro Rockenbach, porém, esse regime seria incompatível com áreas de interesse ambiental ou ocupadas por comunidades tradicionais, caso da Ponta dos Castelhanos.
Ele afirma ainda que, caso não houvesse interesse público e a União optasse pela transferência da propriedade para um ente privado, seria necessária a realização de leilão com concorrência pública. “Fora isso é fraude, é grilagem”, diz o procurador.
Em nota, a Managaba Cultivo de Coco afirma que a área está localizada em terreno de Marinha e que, em 2007, o seu aforamento gratuito foi pleiteado pelo antigo proprietário. A empresa destaca que “diversos documentos asseguram a posse do imóvel pelos sócios”.
“Compramos o terreno em 2008 e, como legítimos proprietários, ocupamos legalmente essa área e continuamos pagando a taxa de ocupação que já vinha sendo paga regularmente há muitos anos”, diz a companhia.
Em 7 de abril, a SPU (Secretaria de Patrimônio da União), vinculada ao Ministério da Gestão e da Inovação em Serviços Públicos, paralisou o processo de instalação do empreendimento. Com a decisão, por 90 dias, os efeitos da transferência de titularidade da propriedade ficam suspensos, até que sejam esclarecidos “os possíveis vícios do processo”.
A audiência pública para discutir o megaempreendimento foi solicitada pelo deputado estadual Hilton Coelho (PSOL) e teve a participação de especialistas, parlamentares e moradores da ilha.
As comunidades se mostraram divididas, com direito a vaias e aplausos, além de princípios de tumultos durante as intervenções.
Cacilda Rocha, do movimento Salve Boipeba, disse que o empreendimento tem potencial para causar impactos irreversíveis na ilha, destacando a supressão de áreas de mata atlântica e o aterramento de manguezais.
Moradores favoráveis ao empreendimento, por outro lado, destacaram que a construção das pousadas e condomínios será um vetor de desenvolvimento da comunidade Cova da Onça. A pedagoga Thaiane Magalhães afirmou que a evasão escolar é um sintoma da falta de oportunidades na comunidade.
No campo político, petistas e bolsonaristas se uniram em argumentos em favor do empreendimento. Líder do governo na Assembleia Legislativa, o deputado estadual Rosemberg Pinto (PT) defendeu o licenciamento ambiental realizado pelo Inema.
“Não é o Ministério Público Federal ou o Ministério Público Estadual o dono da verdade. Essas instituições sugerem e, no limite, acionam juridicamente aqueles que estão cometendo equívocos”, disse. “É bom para quem ganha R$ 40 mil dizer que a população não precisa de emprego lá.”
O deputado estadual Diego Castro (PL) também se mostrou favorável ao licenciamento do projeto. “Eu nunca pensei que fosse concordar com o governo estadual [comandado por Jerônimo Rodrigues, do PT], Mas, se for para defender o desenvolvimento e a liberdade econômica, eu irei defender não importa de quem venha.”
Na contramão dos colegas, o deputado Hilton Coelho (PSOL) disse que os estudos realizados apontam que o território é de propriedade da União, o que inviabilizaria um empreendimento de grande porte.
Também defendeu o desenvolvimento de políticas públicas para geração de emprego e renda a partir da vivência das comunidades tradicionais. “A riqueza daquela região pode ser de usufruto de trabalhadores e trabalhadoras da própria comunidade. Alternativas existem”.
O empreendimento é alvo de uma ação do MPF na Bahia que questiona os impactos para a comunidade local, já que a região está em processo de reconhecimento como reserva de comunidades tradicionais. O órgão pede que a licença ambiental seja revogada.
À época da ação do MPF, a Mangaba disse que o projeto foi submetido a diversos órgãos públicos e que a licença está vinculada ao cumprimento de 59 condicionantes socioambientais.
Afirmou, ainda, que o projeto Fazenda Ponta dos Castelhanos prevê construções em menos de 2% da área total da propriedade, e supressão vegetal em 0,17%, o que garantiria “a preservação naturalmente da APA das Ilhas de Tinharé-Boipeba”. Fonte : politicalivre

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